Cheguei a este mundo, num desavindo e desvairado camarote, de avelhentada nave espacial de terceira classe.
Adávamos por essa altura em meados dos anos trinta do século passado.
Aqui pelos Açores, vestia-se o que calhava. Havia uns felizerdos ( poucos?), que se entretinham a receber os saquinhos com as roupas da América, com um cheiro tão caracteristico que ganhou memória, encontradas talvez no Salvation Army ou nalgum outro e recatado caixote de lixo ao virar da esquina. Mas isto era oiro sobre azul...
Comia-se muito mal. A linguiça e os ovos eram os pratos, não direi favoritos, nem de referência, mas de resistência. A primeira, porque o anafado e pachorrento porco, era o mealheiro, o grande companheiro e o amigo da rotina da vida, que se alimentava tácita e pobremente dos miserandos restos que sobravam do dia-a-dia e (helas!), a subsistência certa, inevitável e possível, depois de levar a naifada no pescoço...
Galinha? Esta aparecia em dias festivos (nem sempre). e era garroteada a preceito em ambiente familiar...e recatado...
Já por essa altura os sacrifícios e os sarcófagos, ou melhor esses sacrificios, muito me impressionavam.
Porquê as galinhas? Ou as vacas, essas até sacrificadas alegremente com direito a despojos de exposição, nas festas ao Divino? Ou até os cordeirinhos, esses tão exaltados na doce e inigmática linguagem biblica judaico-cristã?
Imolados? Era isso. Mesmo sem qualquer culpa formada, a não ser a que lhe conferia da obrigação ou do direito de virem a este mundo, pela mesma Mão...a que cá nos colocou ...
Tudo isto fo-me moldando, modelando e dando uma percepção mais curiosa e activa da vida e da forma como a encarámos e vivemos.
E a conclusão veio mais cedo do que se supunha: vivemos sacrificando tudo o que nos rodeia e não só...
Incluindo, vejam só , o nosso semelhante...
Mesmo rodeados de religiões por todos os lados... até por cima...
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