quarta-feira, 24 de outubro de 2012

QUE MOTIVAÇÕES OU INTERESSES ANDAM POR DETRÁS DESSA POLÍTICA?

Ao analisarmos, o ainda breve percurso do actual governo, fica-nos a impressão de que há, bem ao contrário do que muita gente PENSA E MUITA comunicação social apregoa, uma linha de rumo bem definida. Quando se vê privatizar quase tudo que constitue, por assim dizer, o suporte do Estado, na comunicação, nos transportes, até na própria Saude, fica-nos essa impressão cada vez mais vincada de que as reformas estruturais, de que tanto se fala, passam, não pelo emagrecimento do Estado, mas pelo seu esvaziamento. Até a própria Caixa Geral de Depósitos e os CTT, duas referências importantissdimas naquilo a que chamam Portugal, e que têm apresentado resultados positivos, para além de outras, engrossam a enchurrada das privatizações. De tal forma esta evidência se acentua, e é por vezes tão inconsistente e bizarra, que é curial perguntar: Até onde vamos parar, com essas reformas? Qual a sua finalidade? Quem lucrará com elas, já que alguns serviços a privatizar, e como foi dito, dão ou deram lucro ao Estado e fazem jus, e até parte, de um estatuto a que qualquer Estado de direito tem o dever de preservar? Essa desvirtuação da administração pública é tão visível, quase descarada, por parte de gente que vem das juventudes partidárias, que a desconhece ou nunca soube o que ela representava ou representa para um país, que dá que pensar. Que motivações ou interesses andam por detrás dessa política, é curial perguntar, já que estamos em Democracia? E por falar em Democracia: até quando a teremos? >

domingo, 21 de outubro de 2012

PRÓLOGO DO ROMANCE "SINAIS DE INFINITO" de Humberto Moura

Da Condição Humana ou a necessidade de questionar o mundo Mantendo o seu habitual "low profile", autor humanista que olha o mundo com insaciável curiosidade, Humberto Moura continua a aguentar o rumo da escrita, num percurso literário cujo universo temático consubstancia à sua volta a distância e a ausência, a solidão e o tempo, o amor e o sonho, a vida e a morte no registo mais sentido de uma escrita pessoalíssima e profundamente humana. Neste seu último romance, Sinais de Infinito (edição de autor), 2011) o escritor escreve, de forma universal e intemporal, sobre a natureza da condição humana, suas contradições e perplexidades, harmonias e dissonâncias. Trata-se de uma séria reflexão sobre o desconcerto do mundo e sobre o futuro da Humanidade. Que "sinais" são esses? Antes de mais, os da corrupção e injustiça decorrentes de um capitalismo desenfreado e de um neo-liberalismo feroz com nefastos resultados: crises económicas e financeiras que assolam muitos países. Porque esta obra é uma obra de discutidas ideias e interpretação das mesmas, este é uma espécie de romance tese que evoca e questiona as mitologias do século XX e princípios do século XXI, desmistificando aspectos ligados às civilizações, religiões, culturas, ciências, políticas, poderes, filosofias...Aqui se denunciam os "alcatruzes escorregadios do poder" (pág. 15), os "predadores sociais do universo" e os "sinistros coveiros do ambiente" (pág. 15), a ganância e arrogância dos ditadores. É o "século da loucura" (pág 421). No que diz respeito a Portugal, o fantasma de Salazar paira e ronda por perto. " O homem é ainda o grande mistério deste mundo. E a vida a grande justificaçãp para ele ainda por cá continuar", lê-se na página 82. Acima de tudo esta obra é atravessada por uma séria reflexão sobre o globalização e sobre o destino humano. Porque, afinal de contas, o homem é o grande predador de si e do Universo - esta a grande linha de força deste romance marcado pela ironia, metoníma e sinédoque, e caracterizado por uma boa fluência narrativa, numa articulação feliz entre os discursos directo e indirecto, a discrição, o diálogo e o monólogo interior. Humberto Moura trata bem a língua portuguesa e nele é recorrente verbos pouco utilizados: urissutar e rorejar, por exsemplo. Voz independente e cujo estilo não mimetiza seja quem for, Humberto Moura lança olhares críticos sobre o que somos e o que fazemos. E isto numa altura em que Portugal, com quase 9 séculos de existência, sabe de onde vem, mas não sabe para onde vai...Estamos a viver uma das piores crises da nossa História e nunca como agora sentimos anecessidade de nos reiventarmos e de buscar um novo paradigma para as nossas vidas. Sinais de Infinito dá-nos um espantoso retrato psicológico de uma mulher - Harriet Terra Simpson -, jornalista inglesa ao serviço da BBC que, dentro e fora do Faial, procura reconstituir a vida de Alberto Quevedo Silveira Neiva Brum da Terra, seu avô faialensee protagonista de Sismo na Madrugada, (edição de autor, 2003), anterior romance de Humberto Moura. Quevedo que outrora conhecera, como jornalista e escritor, fama e glória e pelo mundo andara repartido, viria a falecer na cidade da Horta aos 79 anos de idade, vítima do sismo que em 1998 devastou a ilha do Faial, deixando escrito um diário... Transitam daquele para este livro várias outras personagens, com especial destaque para o velho João Maria, farmacêutico, mordaz e irónico, guardador de memórias e dado a esoterismos, e para o jovem médico e homem de ciência Humberto Santos Silva, ambos em busca de um deus ex-machina. Junta-se a este, na presente obra, uma personagem notável: o padre Ezequias Barbosa. Muitas das ideias partilhadas no romance passam por estas três personagens que, ligadas por laços de amizade, mantêm diferentes ideologias, mas respeitando as convicções de cada um. Na tertúlia da Drogaria Hortense (onde noutros tempos pontificavam Nabais e Sampaio, personagens incontornáveis de Sismo na Madrugada, ou à mesa de um bom refogado feito pela serviçal Rosa, este triunvirato ( João Maria, padre Ezequias e Dr. Silva) não se coíbe de discutir e questionar, abundantemente, religião, política, cultura, comunicação social, velhice, vida e morte. Porque se morre? Porque se nasce? Porque se envelhece? Tal como acontecera a Quevedo, algumas personagens de Sinais de Infinito viajam para fora de ilha como forma de perseguir a felicidade e o sonho e para questionar o mundo: para fazer a reportagem da Guerra do Iraque; Harriet sai da Horta para Bassorá, sendo raptada, juntamente com o seu operador de câmara, por um grupo terrorista, e posteriormente libertados pela intervenção dos governos norte-americano e britânico. O Dr. Silva deixa o Faial para ir integrar uma missão humanitária no Médio Oriente. O bibliotecário Pedro de Oliveira (personagem riquíssima e uma espécie de alter-ego de Pedro da Silveira) deixa a iolha das Flores para em Lisboa se dedicar aos livros e ao conhecimento da coisa açoriana. Até porque, convirá não esquecê-lo, os Açores possuem uma História que faz parte da História do mundo. Mas este é também um livro de regressos. Harriet regressará à Horta para prosseguir a pesquisa sobre o avô como se buscasse o Graal. Recebe honras da edilidade faialense (por ter feito um documentário que coloca o Faial no mapa do mundo) e protagonizará aquela que é a mais bela "cena" do romance: banhando-se eroticamente nas tranquilas águas da praia de Porto Pim, e perseguindo uma felicidade idealizada, despe-se e seduz o velho João Maria sem que a cópula se chegue a consumar, naquele que considero um dos mais imprevistos e imprevisíveis desfcechos que tenho lido nos últimos tempos, Curiosamente o romance inicia-se no Cemitério do Carmo com o funeral de Quevedo (morte), e termina na mítica praia de Porto Pim com Harriet banhando-se (vida). Romance sobre a mundividência açoriana e sua carga simbólica, Sinais de Inifinito é, por conseguinte, uma narrativa de cunho documental e de realidade ficcionada a partir da ilha do Faial ("terra da coisa rara"), mas com rotas que foram traçadas a pensar em espaços universais. A coerência do livro está na unidade que consegue extravasar as fronteiras do local, fixando ânsias e incertezas que rompem um mundo fechado e de horizontes cerrados. E, tal como em anteriores obras deste autor, os animais, sobretudo os canídeos e os felinos, estão no mesmo patamar de importância e gozam da mesma atenção em relação aos humanos. Podemos aqui ler páginas magistrais sobre o cão "Juiz" ou a gata "Mona Lisa". Curiosamente o autor despende mais tempo a falar da morte do "Juiz" (descrição comovente!) do que a narrar a morte da cozinheira Rosa. Livro psicológico e reflexivo, a realidade é, em Sinais de Infinito, bem observada e a observação bem exprimida. Isto é clareza na escrita e transparência nas ideias. À boa maneira queirosiana. Este livro é um monumento. E um belo romance para quem o souber ler. Victor Rui Dores