O meu bom, e velho amigo Jorge Diniz, que no mínimo poderá afirmar-se, como "um faialense à antiga", com tudo o que de positivo e saudoso caracteriza a afirmação, em termos de finura, educação, cultura, universalidade, numa palavra, civilidade, comentou um retalho de vida de um "tempo pretérito, penso que fins dos anos cinquenta, e seguintes, tempos diferentes dos de hoje, mas tão saudosos.
E nessas ténues memórias, verdadeiras e já longínquas, estamos retratados, eu e minha saudosa companheira, e esposa, Maria Antonieta, ambos com vinte e poucos anos, vivendo a paixão de um grande SONHO DE AMOR que foi, algo que durou seis décadas e continua. Ela própria, falava em o ter conhecido (o bom amigo Jorge), aliás por ele também confirmado, aquando estava terminando o curso do Magistério (ele jovem aluno), algo que por aqui conheceu momentos bem altos, diga-se, expandindo mesmo, suas competências, eficácias e bom nome, além fronteiras.Vieram mesmo alunos de outras ilhas e do Continente, tal o nome que granjeou. Tudo isto foi e está esquecido, até arrumado como convém...
O que o meu bom amigo escreveu, (já que ele é também um homem dessa área, empenhado, sobretudo na história da sua terra), é sugestivo e verdadeiro; algo que me deixa o sabor acre-doce de uma saudade e uma juventude que passou: era um cachimbo, companheiro amigo das noites intermináveis e invernosas, ao serviço do dever e das comunicações; era a preocupação da hora de chegada de um navio, que vinha deixar doente; a encomenda de um produto urgente que faltava no comércio; Ou um medicamente que fazia muita falta; Ou a alegria exuberante de um estudante, a comunicar que passara o exame. Ou o malfadado Telegrama, sempre urgentíssimo, a perorar, um filho da terra que "sucumbira" em "defesa" da Pátria, lá longe no Ultramar.
E foram muitos os que por lá ficaram... Eram as comunicações feitas dentro do possível, e dando o seu melhor, nada que se compare com o telemóvel, o telefone de hoje, ou a TV que não existia mas que tinha uma outra particularidade muito própria, - a do calor humano.
E o meu bom e digno amigo Jorge Diniz fala também de um carro, um Austin-A35 preto, um "English Car", que me pertencia, e que tem (tem, porque ainda está vivinho da Silva), precisamente 70 anos feitos. E já agora, peço licença para acrescentar às memória, o seguinte: a Horta era uma cidade encantadora, e ainda o é, embora diferente, mesmo sem as preocupações, quiçá legitimas e interessantes, das "Frentes de Mar" ou outras "minudências", que nos vão ajudando a viver e a passar melhor o tempo, por vezes até meditar. E era bonita; e é bonita, porque nasceu assim: bonita.
E permito-me acrescentar, mais umas dicas: Fixei-me definitivamente por aqui, muito embora nunca o pensasse. Foi uma espécie de "jura" assumida, já que a mulher que amei e me acompanhou sempre, a vida inteira, amava como ninguém, esta terra. Emigraram os pais para Estados Unidos, e ela não os acompanhou: amava demasiado o Faial para o fazer. E eu por aqui estou e por aqui fiquei e com o tempo, passei a sentir o mesmo.
Devo dizer que por essa altura, as chamadas Companhias Cabo gráficas, exceptuando a Alemã, a Deutsch como lhe chamávamos, trabalhavam árdua e normalmente, conectando-se com os CTT, em todo o tráfego nacional, ilhas, ex- colónias, e Continente português.
Uma parceria, que se manteve até ao seu encerramento, já fins da década de sessenta.
A Horta por essa altura, era uma cidade diferente. O Pico, nem se fala : a diferença era maior.
Tudo se modificou: algumas "coisas" para melhor, outras para pior. Nada passou a ser igual. Mas continua bela e apetecível. Se calhar a finura das suas gentes, já não será a mesma, a escola é outra. Mas alguns resquícios perduram. Se calhar, as "reaberturas" fora de horas no belo edifício dos CTT, para entregar as cartas, não existem. Os milhares de telegramas de boas festas ou de aniversários;
de pêsames e de outras "quinquilharias", também desapareceram . O dias de "são vapor" e os míticos ronceiros, Carvalho e Lima, que se "afogaram" a reclamar pelo seu fim inglório na sucata e que mereciam outro, o tratamento talvez de museu, que não lhes ficaria mal. Os rebocadores de alto mar holandeses, fundeados na bóia, no meio da doca, ali atrás do Peter.
Ou as pessoas que, como o meu amigo Jorge Diniz, membros de pleno direito de uma terra "bendita" de gente boa e muitos sismos,
o fim de uma geração e de uma plêiade de cidadania inteira, que está ficando reduzida; muito reduzida, e que faz falta.
Um bem haja para ele e para os da sua geração, e um eterno descanso para todos como eu, que sentiram e viveram de perto esse tempo pretérito saudoso, e que por cá já não andam, um como o a que ele se refere: o Rúben Rodrigues. E tantos e tantos outros, chamados para outros "reinos e espaços" e que por aqui andaram, mourejando no dia-a-dia, criando e educando filhos, continuando árdua e diligentemente a senda e a obrigação de viver.
Um bem haja para Jorge Dinis, um gentleman a representar muitos, com que a Horta em outros tempos vicejou.